A universalização de tais bens é uma necessidade estratégica numa sociedade onde o conhecimento é cada vez mais valorizado. Numa sociedade alienada pelo consumo e mercantilização, as conexões virtuais são fundamentais para se construir algo novo, liga os que estão separados e circularidade de informações se torna mais veloz. Um portal de resistência e democratização é aberto...
Na internet a juventude pode criar conteúdos, formatos e tecnologias sem a necessidade de autorização dos poderosos chefões dos governos e corporações.
Bem-vindos ao deserto do (i)real! Na contramão da universalização do acesso digital encontra-se o projeto de Lei do senador Azeredo. Não por outro motivo tal lei já é conhecida como o AI-5 digital. Em resumo: o projeto cria crimes informáticos e estabelece restrições ao acesso à internet, estabelecendo-se, assim, a Omertà - lei do silêncio siciliana - à juventude.
Porém, os crimes são vagos e imprecisos, de modo que condutas praticadas pelos jovens (baixar músicas, filmes e textos) do dia para a noite se tornarão crimes. Tudo em defesa da propriedade intelectual, ou como diz o texto da lei “informações protegidas por restrição de acesso”. Uma verdadeira criminalização do cotidiano. O livre acesso à informação e a cultura será punido com 1 a 3 anos de prisão, uma pena 6 vezes maior que a violação de domicílio!
Art. 285-A “é crime acessar, indevidamente, informações protegidas por restrição de acesso, contidas em sistema informatizado".
O pior de tudo é que o projeto de lei permite que todos os nossos passos virtuais sejam registrados. Uma liquidação dos direitos individuais (intimidade, liberdade, segurança etc..). Abrindo brecha para um totalitarismo informático, onde provedores se tornarão verdadeiras polícias privadas, registrando todas as entradas e saídas de sites e programas (por até três anos!!). Um verdadeiro panótipo virtual. Vigiar e punir em nome do lobby das grandes corporações.
Além disso, o pressuposto para acessar a internet será o cadastramento (nome, endereço, RG, filiação) dos usuários. O que isso significa na prática: que sistemas abertos (lan houses, por exemplo) não terão condições de cadastrar seus usuários. Ou seja, a inclusão digital restaria certamente prejudicada. O custo do certificado digital é bastante alto, o que inviabiliza o acesso a internet de grandes parcelas da população.
A restrição de acesso aos bens culturais começa a povoar o nosso ordenamento com a criminalização da pirataria (LEI No 10.695, DE 1º DE JULHO DE 2003).. No ano seguinte, o governo federal cria o Conselho Nacional de Combate a Pirataria (CNCP), o qual com a desculpa de combater falsificações (o que é completamente diferente de pirataria, já que esta se refere a cópia) atua como um braço político para garantir os interesses das editoras, gravadoras e empresas de software.
Sob o lema “pirataria tô fora: só uso o original” o governo Lula empreende uma verdadeira caça aos direitos culturais da juventude pobre, pois se esquece que o acesso ao “original” é um privilégio de poucos. A maior parte da juventude não tem acesso à cultura indo a teatros e cinemas, mas sim mediante a ruptura com os limites da propriedade intelectual (quem não viu Tropa de Elite pirata?).
A propriedade intelectual nunca visou tutelar os direitos do autor, mas sim garantir o monopólio da reprodução das obras, não por outro motivo é conhecida como copyright (direito de cópia). A propriedade intelectual é uma ficção jurídica criada para tutelar interesses das grandes corporações de software, editoras e gravadores, uma excrescência jurídica até para os ordenamentos burgueses. Eis o paraíso da reificação: a possibilidade de transformar as idéias em mercadorias. A chance de cercar cada espaço da vida e dizer que se trata de uma propriedade.
A propriedade é, e sempre foi, um instituto jurídico caracterizado fundamentalmente pelo direito de usar, gozar e dispor com exclusividade da coisa.
Um proprietário de um apartamento, por exemplo, tem interesse no uso exclusivo do imóvel, pois é evidente que não se sentiria confortável com a presença de pessoas estranhas em sua sala, cozinha ou banheiro. Já o autor de um livro ou o compositor de uma música tem justamente o interesse oposto, pois ninguém produz uma obra artística para o seu deleite egoístico. Quanto mais pessoas lerem e ouvirem uma criação, tanto maior prazer trará a seu autor, que terá seu talento reconhecido.
Um proprietário de uma fazenda tem interesse em fruir com exclusividade dos frutos de sua terra e é natural que não deseje dividir sua colheita com ninguém. O escritor de uma obra de caráter técnico-científico, por outro lado, tem interesse em ser citado em obras de outros autores e, longe de desejar impedir que outros fruam de suas idéias, sente-se honrado com a menção que fazem a seu trabalho. O autor, porém, nada perde com a cópia da sua obra. Pelo contrário, quanto mais pessoas lerem seus textos, ouvirem sua música e apreciarem a sua arte, tanto mais reputação ganhará na sociedade
(Túlio Vianna – A Ideologia da Propriedade Intelectual)
A criminalização da pirataria afeta diretamente aos universitários. Em algumas faculdades as editoras já ocuparam os lugares das xerox’s e já imprimem os capítulos dos livros didáticos com um selo de autenticidade. O problema é que a cópia por folha custa em média 6 vezes mais do nas xerox’s normais, o que certamente aumenta e muito o custo da formação.
Nesse sentido, a juventude deve defender seu direito a cultura e a informação. Por isso, defendemos a descriminalização da pirataria e devemos lutar para que a Lei Azeredo (AI-5 digital) não seja aprovada. Neste momento, toda forma de mobilização (abaixo assinados virtuais, panfletos etc.) é importante. É preciso garantir a universalização e democratização do conhecimento. É a resistência que cria novas formas de viver...
*Rafael "Mau Mau" Tristão é aluno da Faculdade de Direito da UERJ e membro do Movimento Direito Para Quem